Os óculos, o óculos?
Na fala do dia-a-dia, mesmo a mais formal, a tendência no português do Brasil é utilizar a palavra ÓCULOS como se ela fosse singular. Ex. "Não acho meu óculos", "Preciso comprar um óculos de sol", "O óculos dela é chique!" etc. Se você fala assim, não se preocupe; a maioria dos brasileiros usa (oralmente) o termo óculos dessa forma. Claro, se você prefere usá-lo conforme a norma culta (como vou mostrar) na fala, em especial em contextos mais formais, leia as reflexões abaixo.
Bem, buscando no Dicionário Eletrônico Houaiss, encontro o seguinte significado para "óculos" (sentido semelhante ao encontrado no Miniaurélio Eletrônico: substantivo masculino plural, dispositivo usado para auxiliar, corrigir ou proteger a visão, que consiste em um par de lentes sustentadas em frente dos olhos por uma armação; lunetas. Etimologia: plural de óculo. Temos aí uma informação importante: é plural de óculo, que é cada uma das lentes que compõem os óculos.
Cito mais uma vez Houaiss, mas dessa vez para concordar com o conceito e discordar da abordagem:
Na observação sobre gramática e uso da palavra óculo, ele diz que a palavra óculos é naturalmente plural [pluralia tantum] (só no plural é que ela representa o objeto de correção da visão do qual estou falando nesta postagem): "a palavra óculos é pluralia tantum (ver), sendo, portanto, erro a discordância de número (um óculos) que se tem vulgarizado no português coloquial do Brasil (formas corretas: uns óculos, meus óculos, um par de óculos)".
De fato, segundo a gramática padrão, os determinantes que se referirem ao substantivo "óculos" devem concordar com ele no plural. Então: "Não acho meus óculos", "Preciso comprar uns óculos de sol / um par de óculos de sol", "Os óculos dela são chiques". Usemos dessa forma nas situações de discurso que exijam o uso da linguagem formal (falada ou escrita).
Discordo, por outro lado, da forma pejorativa com que o dicionário se refere à língua coloquial, usando termos como erro e vulgarizado, ignorando os inúmeros avanços que as diversas vertentes da linguística trouxeram e trazem constantemente. Como eu disse no início da postagem e em algumas outras, a língua falada se constitui no próprio uso *(João Wanderley Geraldi, 1991)*, e não exige, portanto, um uso exatamente como determina a gramática padrão(GP). Mesmo em contextos formais, há construções na norma padrão que soam artificiais quando faladas. Na escrita formal, por outro lado, devemos nos adequar à GP, sendo, contudo, realistas e atentando ao fato de algumas construções serem pouco usadas "no papel" atualmente (mesóclise, por exemplo). Cabe ao falante, portanto, conhecer e usar as diversas variedades de sua riquíssima língua portuguesa de acordo com suas necessidades.
Tenho dito.
* "Como o trabalho linguístico é contínuo, realizado por diferentes sujeitos, em diferentes momentos históricos, em diferentes formações sociais, dentro das quais diferentes sistemas de referência se cruzam (e se digladiam), a língua que se vai constituindo mantém-se porque se modifica." (Pág. 14, Portos de Passagem, João Wanderley Geraldi, São Paulo, Martins Fontes, 1991)
Abraços
Diogo Xavier
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