Por Luiz Felipe Soares *
No último dia 25 de outubro, em Brasília, a Câmara dos Deputados aprovou a PEC 241 – mais conhecida como a Proposta de Emenda Constitucional da “desigualdade social” – enfatizada pelo governo, publicizada pelos especialistas, sobretudo apoiada por setores da imprensa, como a solução para o ajuste fiscal.
Enviada ao Senado, a proposta, agora nomeada de PEC 55, caso também aprovada, instituirá um novo regime fiscal no âmbito do Orçamento Fiscal e da Seguridade da União pelos próximos 20 exercícios financeiros. Trata-se, segundo os defensores da PEC, de impor um teto aos gastos públicos.
Para nós, estudantes, a PEC 55, ou melhor, da “maldade”, é um ultraje sem precedentes ao nosso já combalido estado de bem-estar social.
A PEC 55 propõe limitar, por exemplo, os investimentos em saúde e em educação no setor público pelo Governo Federal ao índice de inflação nacional (IPCA) divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). As despesas “primárias” do ano corrente serão reajustadas apenas pelo IPCA do ano anterior. Portanto, o orçamento da saúde pública referente ao ano de 2019 seria orçamento de 2018 desta mesma área acrescido tão somente da variação da inflação desse mesmo ano.
Esta é, sem dúvida, a medida de austeridade fiscal mais ortodoxa da história do Brasil. Significa a consolidação, após o desfecho do processo de impeachment, ou melhor, do golpe parlamentar – que destituiu uma presidente eleita democraticamente – de um grupo político que representa as velhas oligarquias que por décadas governaram o país.
Embora a PEC 55 esteja incluída em um conjunto maior de outras propostas como a “Escola sem Partido”, a “Reforma do Ensino Médio”, a “Privatização do Pré-sal” e outras que destruirão o sistema de proteção social que incluiu definitivamente os mais pobres no orçamento público, sobretudo nas últimas duas décadas, à revelia dos seguimentos mais conservadores da sociedade brasileira.
‘Magnum opus’, por hora, do Governo Michel Temer, a polêmica PEC 55, propagandeada como medida indispensável ao equilíbrio fiscal e, portanto, necessária para a volta do crescimento da economia brasileira – sob os auspícios da alcançada “governabilidade” – tem na verdade desajustado a máquina pública até então a serviço dos que mais precisam, articulando-se para “tirar o Brasil do vermelho” – metáfora declamada por Michel Temer e sua claque cujo propósito seria reerguer os pilares macroeconômicos da economia nacional, mas que escamoteia o real sentido da expressão: “livrar o Brasil do PT (Partido dos Trabalhadores), dos movimentos sociais e da esquerda política em geral”.
O que temos visto é o desmonte de uma plataforma política de inclusão social que elevou mais de 40 milhões de pessoas da pobreza à classe média (classe C) nas últimas décadas. A PEC 55 é a expressão mais fenomênica da diminuição do estado e de uma guinada ao neoliberalismo que tanto deteriorou a classe trabalhadora nos anos de 1990.
Um exemplo disto é quando analisamos os efeitos da PEC 55 para os próximos anos. Vejamos: se levarmos em consideração aplicação das regras da PEC já a partir de 2017, o orçamento para a saúde pública de 2018, financiado só pela fonte do Tesouro Direto, será R$ 121,1 bilhões ou R$ 579,29 por habitante – ou seja, o orçamento de 2017 de 115,4 bilhões, conforme previsto na Lei Orçamentária de 2017, reajustado pelo índice de inflação (IPCA) de 5% esperado pelo Banco Central para 2017 divulgado no último relatório da instituição (o boletim focus) dividido pela expectativa populacional para 2018 de 209.186.802 milhões de habitantes segundo o IBGE.
Para 2021, utilizando as expectativas do índice de inflação (IPCA) para os anos de 2018, 2019 e 2020, 4,65%, 4,53% e 4,48%, respectivamente, informadas pelo sistema de expectativa de mercado do Banco Central, teríamos um orçamento público para a saúde que equivaleria a R$ 644,92 por pessoa, considerando a projeção da população nacional para o ano de 2021 de 213.440.458 milhões de habitantes.
Assim, de 2018 a 2021, sairíamos de um investimento per capita em saúde pública de R$ 579,29 para R$ 644,92, um acréscimo equivalente a 10,1% em termos percentuais. Entretanto, ao descontarmos o acumulado da inflação nesse mesmo período (2018, 2019 e 2020) cujo índice previsto é de 13,66% em cima desse aumento de R$ 65,63, teremos um saldo negativo percentual de 3,56%.
Portanto, o Governo Federal, através do seu Tesouro Direto, estará investindo por habitante em saúde pública, no ano de 2021, 3,56% a menos do que investirá em 2018. Enquanto que o crescimento do investimento per capita na saúde pública será de 10,1%, a inflação vai ser de 13,6%.
Indignados com os efeitos perversos do “Pacote de Maldades” do Governo Temer, milhares de estudantes veem ocupando escolas e universidades para protestar contra a retirada de direitos conquistados outrora. Já são mais de mil escolas, universidades e centro acadêmicos ocupados em todo país. Os estudantes precisam assumir o protagonismo da luta contra o retrocesso, ou o Brasil corre o sério risco de voltar a ser a forma cabal da paradoxal “Belíndia” (uma mistura de Bélgica com a Índia) – um país dividido socialmente entre os que possuem condições de vida de um país feito a Bélgica e outros com condições iguais a um país como a Índia.
* Luiz Felipe Soares é mestrando em Sociologia pelo PPGS/UFPE.
FONTE: Blog do Inaldo Sampaio
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